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“...” aplausos! Soa como silêncio...

No principio era o silêncio...

 

O nada, o zero... o vazio existe?

Causaria efeito o nada em nossa mente?

Qual a necessidade de se falar do vazio? 

Qualquer signo ou código é um substancial vazio - depende de uma mente para desabrochar a corola de interpretações.

Hiâncias eternas...

 

John Cage (nascido em 05 de Setembro de 1912, em Los Angeles, na Califórnia - falecido em 12 de Agosto de 1992, em Nova Iorque); foi um compositor emblemático, expoente de estrondosos silentes sons. Sua famosa Obra 4`33” é seu mito - sua Obra Prima e vanguarda; composição gestada em quatro anos; todavia, sem corpo, transparente, sem esqueleto, aberta e desossada.


Ao apertarmos o play de sua peça 4`33” nossos ouvidos se defrontam com o absoluto NADA !


Simplesmente o NADA – não há canção sendo executada.

Somos apresentados ao hiato, a inquietação da paz...   

 

O músico Cage pertence a corrente Minimalista, a “Minimal Art”,  estilo artístico germinado na década de 1950, influência direta do artista plástico francês Marcel Duchamp (Movimento Dadaista - ready-made, que originaria a Arte Conceitual); e do americano Robert Rauschenberg (arte como objeto, mistura de materiais e métodos).


Aliás, é justamente Rauschenberg - com suas criações em planos totalmente monocromáticos em branco e preto (de 1949) -, que inspirarão todo o manancial de significados em Cage.

 

O Movimento Minimalista tem como intenção o espírito fenomenológico; mais que arte estática, o propósito era vivenciar o espaço circundante, os materiais utilizados pela arquitetura da arte, a fabricação de ruídos num ambiente ortodoxo e limitado pela sua própria existência; o volume das coisas, cor e tamanho apequenavam ou agigantavam o individuo na participação ativa na construção de sentidos.

 

( interessante lembrar do grande Erik Satie, o qual dizia que sua música era uma “mobília” ).

 

Umberto Eco, teórico italiano, falecido em 2016, mundialmente reconhecido por seus estudos de Estética, corrobora com seus tratados à busca do entendimento das manifestações Culturais: “a informação não é tanto o que é dito, mas o que pode ser dito. A informação é a medida de uma possibilidade de escolha na seleção de uma mensagem (...), a informação representa a liberdade de escolha que se tem ao construir uma mensagem” (ECO, p. 13).

 

Neste conciso texto, queremos ouvir a Obra de Cage, interpretar os mudos códigos de sua música, a partir de um contexto definido já a priori: a própria música como manifestação cultural. O que está em jogo para ser interpretado é o fenômeno cultural do espetáculo do silêncio enquanto Arte.


O vazio em sua Obra é proposital, vilipendia o espectador, deixa-o inquieto, quer despertar sensações à mente do espectador a partir, justamente, deste grau zero, do nada. É um depósito de muitos silêncios e muitos gritos. Destarte, visto ser Obra de Arte, e, sendo Arte, já nos posiciona numa contexto gerativo de significados – a Arte exige e pressiona por significados.  

 

John Cage expunha que a música poderia ter uma nova conceituação, não só aquele inviolável, baseado em melodias cadenciosas; o americano parecia desejar que nos jogássemos ao vácuo para extrair a nossa forma limpa, despir-nos de preconceitos, visto os prejuízos a afetar aquele que já chega armado a exposição de algo.


O código (a música ou o silêncio) introduz - com seus critérios de ordem - possibilidades de comunicação (sempre ideologia); o código representa um sistema de probabilidades sobreposto à equiprobabilidade do sistema inicial; o código é um repertório de símbolos que se distinguem por oposição recíproca, dirá Eco.


Interessante notar em Eco a matemática lógica da geração de interpretação a partir de um código, o sentido advindo de uma expressão. Sendo expectador da Obra de Cage, nos reorganizamos no silêncio, amiúde, temos nosso corpo, temos um espaço físico, temos nossos vestuários e os outros acerca de nós que, na inquietude do nada, fará aflorar em nós quantidade vasta de sentidos, a partir do silêncio de 4`33” de Cage.


Parece que Cage nos intima e nos coloca à prova, na forca da verdade: onde estão os seus signos? O que transborda de você a partir do zero?

 

Eco afirma “introduzindo o homem, passamos para o universo do sentido”, abrindo ai, um processo de significação intrínseco aquele que se depara com a mensagem - o expectador!; o destinatário terá de suprir de significados o que vê e ouve, constelação inerente a seu repertório e, expectativas...


Este código, tal Aleph de Borges que tudo vê, traz consigo o despertar à contemplação, ativa no expectador o sintoma de vida, faz desenhar em sua mente sentidos a partir de si, germinando léxicos. A experiência do vazio é um desafio que, neste corolário de sentidos, frente a um léxico conotativo, cristalizará angústias, medos, ou o eclodir da beleza estética. 


As expectativas frente ao universo previsível fora quebrada; jamais estamos preparados para assumir a desorientação do código – o novo; quebramos as circunstâncias (conjunto de condições previsíveis num contexto historicamente já demarcado por léxicos denotativos e conotativos), os quais já teríamos imagens plausíveis: música, calmaria ou romance... Cage deturpa as circunstâncias e provoca uma crise no sistema de expectativas.  

 

A estreia de 4’33” ocorre em 1952, interpretada pelo pianista David Tudor que, fixado no palco, utiliza-se de leves movimentos para demarcar a passagem do tempo musical frente ao piano de calda.


Durão salienta o rigor do nome; primeira hipótese: referência à música de sucesso 4’33” (à época), seria um tempo aproximado de um Hit - o silêncio é seu contrário: um repensar das categorias já consolidadas; ou, segunda hipótese: os duzentos e setenta e três segundos referem-se a escala Kelvin de Temperatura ( menos 273°C corresponde a 0°C (escala Celsius), o zero absoluto, sinalizando, tão logo, o estado de repouso das moléculas.


Eco demarca que “o que entra em crise não é o código como sistema de expectativas semiológicas (...), mas, o patrimônio de saber do destinatário, como sistema de expectativas psicológicas, históricas, científicas”, (ECO, 1971, p. 50).


 

Referências Bibliográficas:

ECO, Umberto. A Estrutura Ausente.

 

Referências Eletrônicas:


Por Gustavo Pilizari

Jornalista; Mestre em Comunicação, Cultura e Semiótica; MBA em Liderança; Pós em Psicopedagogia e Neurociência; Extensão em História e Semiótica; Professor, Consultor e Palestrante; Atual Secretário de Cultura e Turismo de Quatá

Contato: 18 99789-3645




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